(ANS – Roma) – Com a proximidade do 207º aniversário do nascimento de Dom Bosco e com o mesmo desejo do Santo da Juventude de ir ao encontro dos jovens onde eles estão, o Conselheiro Geral para a Comunicação Social inicia uma nova série de reflexões para explorar o tema: “Educar e evangelizar hoje no habitat digital. Junto aos jovens, rumo ao futuro”. Hoje publicamos a primeira delas.
Educar e evangelizar, hoje, no habitat digital junto aos jovens, rumo ao futuro
Gildasio Mendes – SDB
Como evangelizar, hoje, no ambiente digital?
No Sínodo dos Jovens, a Igreja abordou este assunto importante, sugerindo a necessidade de compreender as dinâmicas deste ambiente, bem como a importância de dialogar com suas culturas e evangelizar este habitat.
“O ambiente digital constitui, para a Igreja, um desafio em vários níveis, sendo imprescindível aprofundar o conhecimento das suas dinâmicas e o seu alcance dos pontos de vista antropológico e ético. O ambiente em questão requer não só que o frequentemos e promovamos as suas potencialidades de comunicação em ordem ao anúncio cristão, mas também que impregnemos de Evangelho as suas culturas e dinâmicas.” (Documento Final do Sínodo dos Jovens, nº 145).
Buscando responder à solicitação do Papa acerca do tema do digital e da evangelização, gostaria de começar por você, que acompanha esta série de reflexões, fazendo uma leitura do momento que estamos vivendo, sobretudo por causa da pandemia e da guerra, e refletindo sobre como situar este panorama complexo na perspectiva da comunicação. O objetivo desta série de artigos é aprofundar as grandes questões dos educadores, evangelizadores, famílias, padres, religiosos, jovens e comunicadores em relação a: infosfera, metaverso, inteligência artificial, ética e digital, privacidade e segurança, algoritmos, antropoceno, ciência biométrica, grandes empresas de comunicação e suas estratégias de poder, controle de dados pessoais, nanotecnologia, biotecnologia, tecnologia genética e muito mais. Neste contexto, queremos aprofundar os princípios e a metodologia da comunicação e da evangelização nestes novos cenários, que se tornam cada vez mais complexos no presente e no futuro.
PRIMEIRA PARTE
Nos últimos dois anos, a humanidade passou por duas grandes crises: a primeira, sanitária, relacionada à Covid-19, pandemia que ainda afeta o mundo e trouxe consigo uma grande mudança social, econômica e sanitária. A outra, mais recente, causada pela guerra russo-ucraniana, situação que muitos acreditam ser o início de uma nova geopolítica mundial, capaz de mudar a política, a economia e a segurança do planeta.
Em ambas as situações, as mídias sociais desempenharam um papel importante na forma social de buscar e compartilhar informações entre familiares e amigos, na forma de interpretar a maré de notícias que a mídia constantemente produz e também na forma de situar–se existencialmente no mundo.
Fazemos parte desta imensa rede de conexão digital e virtual. As estatísticas indicam que em pouco tempo o digital provocou uma grande mudança na vida das pessoas, na forma como elas administram suas vidas e em sua maneira de lidar com a realidade.
Além disso, a combinação da comunicação do digital com a internet e a inteligência artificial gerou um amplo e complexo habitat de comunicação, contribuindo significativamente para o desenvolvimento humano e social. O digital tornou-se parte da vida das pessoas e das instituições. A própria União Europeia propôs, no centro de seu plano de desenvolvimento para o futuro, um grande projeto intitulado “Década Digital da Europa: objetivos digitais para 2030”.
Os temas incluem cidadania digital, transformação digital das empresas, infraestrutura digital e sustentável. O crescimento do ambiente digital, seja no âmbito pessoal como no institucional, traz à tona a dinâmica das relações humanas, as novas descobertas científicas e tecnológicas, além de abrir possibilidades para a educação, para o comércio e para o trabalho. Neste contexto, emergem, ao mesmo tempo, a diversidade e a ambiguidade das informações. A pergunta que podemos nos fazer imediatamente é: qual a nossa percepção da realidade da vida e do mundo através do digital? Qual o papel das mídias sociais em nossa vida cotidiana ou em nossas relações com os outros, como pessoas e como cidadãos?
Por meio destas perguntas iniciais, gostaria de abordar alguns pontos referentes ao universo digital. Em nível conceitual, é importante afirmar que a comunicação nas mídias sociais envolve três aspectos inseparáveis: o digital, a internet e a inteligência artificial. As redes sociais fazem parte da composição global do ciberespaço, e estão inseridas na plataforma global do universo virtual.
É sempre necessário, portanto, estabelecer uma ponte entre o uso das mídias sociais e a realidade mais ampla e convergente. Por exemplo, quando usamos o WhatsApp para compartilhar notícias com amigos, já estamos dentro do habitat digital e em rede com o mundo inteiro, envolvidos de maneira cognitiva e afetiva no universo virtual.
Por trás da utilização das mídias sociais há sempre o indivíduo, sua cultura, sua história, seus valores e sua maneira de se inserir em seu contexto social. Por trás deste habitat virtual se encontra a complexidade da realidade social, econômica, política e religiosa, que afeta diretamente a forma de comunicar e de utilizar as mídias sociais. Por exemplo, a pobreza, a grande clivagem digital que afeta particularmente a África.
Por trás deste universo digital estão os diversos sistemas científicos criados para identificar e interpretar pessoas, como por exemplo a neurociência, a inteligência artificial, a biotecnologia e a bioética. Neste sentido, portanto, qualquer análise sobre a nossa maneira de usar as redes sociais nos põe em confronto com a vasta complexidade de análise do fenômeno digital.
No habitat digital não existe neutralidade! Estar na rede significa estar envolvido em um imenso e complexo sistema de comunicação global onde somos confrontados com ideologias, com fake news, com um areópago com interesses e controle de grandes empresas digitais, com o poder do capital e dos diversos interesses ideológicos e com a nova geopolítica, fortemente organizada a partir da Ciber Security.
A privacidade, a segurança, o desenvolvimento da ciência biométrica, o controle de dados pessoais, o avanço da inteligência artificial e o mundo dos algoritmos estão mudando a forma como nos comunicamos, mudando rapidamente o cenário socioeconômico e cultural da nossa época.
Vivemos em uma sociedade caracterizada pela velocidade, fluidez, mudanças e inovações. O comércio eletrônico e as finanças digitais criaram novas relações geopolíticas e muitas coisas estão mudando: conhecimento é poder. Os mercados digital, financeiro e econômico estão transformando o modelo de negócios de pequenas e grandes empresas e da educação.
A comunicação muda a cultura e a maneira como as pessoas vivem e socializam. Ela está intrinsecamente ligada à política, à economia, à educação e aos interesses de indivíduos, grupos e empresas. Neste contexto, a tecnologia emerge provando seu grande poder e desenvolvimento: da inteligência artificial à nanotecnologia, da biotecnologia à tecnologia genética.
Neste imenso universo, ao qual as pessoas convergem por meio das redes sociais e da Internet, estão as grandes utopias e as realidades que envolvem a corrente do transumanismo, o desafio ecológico e, como consequência, uma possível nova antropologia.
Na segunda parte deste artigo, que será publicada no próximo mês, continuaremos nossa reflexão falando sobre a Infosfera e o metaverso.